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Crianças Especiais

Abasteça-se com informações para compreender as necessidades e cuidados com crianças especiais.

Interagindo com o bebê especial

A grande maioria das pessoas se imagina despreparada para cuidar de um filho especial. Parece-lhes que criar um filho normal é tarefa para a qual já se nasce pronto. Nenhuma preparação, nenhum aperfeiçoamento é necessário. Bastaria a esses pais seguirem seus instintos e tudo caminharia naturalmente.

Porém, a criança que nasce ou se torna especial representa o desconhecido, independente do grau de seu comprometimento. Os pais sentem-se incompetentes, atemorizados até pela idéia de criar e educar um filho especial.

O filho normal corresponde ao idealizado, sonhado, projetado e introjetado. Todas as etapas da vida estão imaginadas, programadas e previstas, mesmo que inconscientemente. Por experiência ou por comparação os pais sabem ou pensam que sabem como será a vida com este filho.

Com a criança especial tudo é diferente. Ela representa o inesperado, indesejado, desconhecido. Até que dor, surpresa, rejeição sejam superados um certo tempo decorre (as vezes uma vida inteira!). Desde o momento da notícia ou da descoberta os pais serão confrontados a todo instante com estes sentimentos e ainda com o da incompetência (imaginada) para cuidar desta criança.

Sabe-se porém que educar um filho normal ou especial exige dos pais a mesma dose de instinto e preparo, de arte e técnica. O filho especial vai necessitar certamente, na maioria dos casos, uma maior dose de dedicação. Criar um filho é tão prazeroso e perigoso como pilotar um avião. Com o filho normal a criação pode ser feita em “piloto-automático”, ele vai quase sozinho… Já a criança especial exige um vôo manual, é preciso estar sempre observando a altitude, controlando os instrumentos, acelerando os motores, etc. O trabalho e a preocupação são tantos que às vezes o piloto até se esquece de apreciar a viagem e a paisagem…

Mas para aqueles que conseguem vencer as mais do que compreensíveis dificuldades iniciais muitas alegrias estão reservadas. Quem tiver olhos de ver, coração de sentir, será capaz de interagir com muita alegria com seu filho especial.

Interação obviamente é um relacionamento de mão-dupla, onde os participantes se relacionam e se modificam mutuamente. Todos dão, recebem e se transformam. Crescem e amadurecem. Apesar de todas as frustrações e dificuldades criar um filho, especial ou não, é uma das mais enriquecedoras experiências de vida que alguém pode ter.

Conhecendo estas fases fica muito mais fácil interagir com a criança especial, para tentar otimizar seu progresso.

E por que o desenvolvimento se atrasa?

Existem várias situações, que podem levar a um desenvolvimento atrasado. Fatores congênitos (genéticos ou hereditários), ambientais, psicológicos, doenças adquiridas, entre outros.

O atraso no desenvolvimento não é necessariamente patológico ou anormal. Prematuros, crianças muito tímidas, ou ainda aquelas muito desprovidas de estímulos podem se atrasar. Crianças superprotegidas como são às vezes hemofílicos ou diabéticos também podem apresentar este problema.

Já as condições patológicas que podem levar a um atraso no desenvolvimento são muitas.

O desenvolvimento pode estar comprometido, em maior ou menor grau em várias situações congênitas, como síndromes genéticas. Ou ainda situações que levem à diminuição da oxigenação cerebral durante a gravidez e o período peri-natal (antes, durante ou após o parto).

Os problemas no período peri-natal como partos difíceis, bebês prematuros, problemas relacionados à saúde materna e outras intercorrências podem levar ao aparecimento da paralisia cerebral, que vai levar a alterações no desenvolvimento.

As doenças metabólicas como hipotireoidismo ou fenilcetonúria, não tratadas, já foram causa importante de problemas no desenvolvimento. A aplicação em massa do “teste do pezinho” levou ao diagnóstico e tratamento precoces, com enorme melhora no prognóstico destas crianças.

Existem as situações onde o problema foi adquirido, ou seja a criança se desenvolvia normalmente mas após um problema agudo torna-se deficiente. Exemplo são as seqüelas de meningite, acidentes em geral e os acidentes cirurgico-anestésicos.

Nos casos de distrofia muscular a criança começa a involuir, perdendo habilidades antes adquiridas.

Uma das situações mais difíceis ocorre quando apesar de todas as tentativas não se consegue esclarecer a causa do comprometimento de uma criança. A falta de um diagnóstico provoca nos pais (e de certo modo também nos profissionais) muita angústia. Por vários motivos saber pelo menos o nome do problema de seu filho é uma necessidade fundamental dos pais.

Qualquer causa que leve a uma deficiência, seja mental, física ou sensorial, poderá primariamente ou secundariamente comprometer o desenvolvimento da criança.

No outro extremo estão as crianças chamadas super dotadas ou que tem altas habilidades. Apesar de seu potencial elevado, também são especiais, pois precisam de adequada orientação psico-pedagógica.

Há situações em que o comprometimento se dá na estatura, que pode estar aumentada (gigantismo) ou reduzida (nanismo). Nestes casos o desenvolvimento geralmente não é afetado.

As crianças que tenham um alto risco para alterações no desenvolvimento, por qualquer um dos fatores citados anteriormente, devem ser acompanhadas com muito mais cuidado e atenção, se possível em ambulatórios especializados em desenvolvimento neuro-psico-motor.

Portanto, quando uma criança tem seu desenvolvimento comprometido, o que pode ser feito pelos pais para estimular e melhorar seu desempenho ? Tentar responder esta questão é o principal objetivo.

O tratamento depende da causa, que como vimos pode ser muito variada. Muitas vezes não há tratamento possível e só existe a prevenção.

De qualquer forma, é preciso deixar bem claro que o tratamento da criança é de responsabilidade dos profissionais que a atendem, sob a supervisão dos pais.

Os profissionais devem atuar em harmonia com os pais, mas os papéis são completamente diferentes. Embora isto seja óbvio, na prática a não compreensão desta distinção de papéis é causa freqüente de frustrações e de tensões entre os envolvidos. O prejuízo maior fica para a criança.

Terapeuta é para tratar, pai é para educar, criar, ensinar, estimular, amar.

A chave para a boa interação entre pais e filhos é o carinho, amor. Por mais que possa parecer romântico demais ou melodramático, este sentimento poderoso é o grande segredo da boa relação dos pais com seus filhos especiais.

Para que um pai ou mãe consigam amar seu filho especial é preciso que a rejeição (normal, natural, humana) seja superada. É preciso que seja feito ou refeito o vínculo entre eles e especialmente nos primeiros meses, entre mãe e filho. Através dos mecanismos de sensibilidade ainda pouco conhecidos, a criança tem que saber que os pais querem que ela cresça, se desenvolva, viva.

Se os pais (e aqui não vai nenhum julgamento) querem que seu filho morra, não precisam dizê-lo com palavras. A criança vai saber e nem os mais famosos terapeutas ou os melhores remédios serão capazes de melhorar o desempenho desse paciente.

Ser capaz de desejar de verdade que seu filho desenvolva ao máximo seu potencial é o primeiro passo. Aqui também ocorre um feed-back, onde o amor familiar estimula a criança a progredir. E o progresso da criança alimenta o amor da família.

Quanto mais cedo for feito o diagnóstico e ocorrer a aceitação, melhor. Nos problemas congênitos ou que são diagnosticados nos primeiros meses de vida é possível aproveitar uma característica do cérebro chamada plasticidade neuronal. Através deste mecanismo é possível que a função de uma área lesada do cérebro seja assumida por uma área vizinha. Isto se a criança receber estímulos e trabalho terapêutico adequados.

Muitos desafios novos surgirão para a família que superou as dificuldades iniciais e vai então empreender esta viagem em vôo manual.

O primeiro deles é manter, ao máximo, a rotina normal da casa. Terapias que exigem grandes mudanças, desistência de empregos e projetos de vida, estão fadadas a fracassar. Na melhor das hipóteses vão agir de forma muito negativa, neurotizando a dinâmica familiar. Deve-se evitar ao máximo que o tema deficiência seja o centro das atenções familiares. Mais do que nunca, manter o equilíbrio, o bom contato entre todos os membros do núcleo familiar é fundamental.

Sabe-se que são comuns as separações após o nascimento ou a descoberta de que uma criança é especial. Assim, mais do que nunca o diálogo entre o casal, a tolerância mútua, o equilíbrio são essenciais para evitar este desfecho.

Os irmãos tem o direito de serem informados dos acontecimentos, não se deve esconder nada. Eles geralmente sofrem mais por sentir tristeza e angústia nos pais, sem saber o que ocorre, do que quando são corretamente notificados da situação verdadeira. O boato é pior do que o fato… É preciso fazer uma boa divisão do tempo, para que ninguém fique esquecido.

É muito saudável que os irmãos e toda a família sejam envolvidos nessa interação para que ninguém se sinta excluído. As crianças e os avós (especialmente a avó materna) geralmente aceitam as dificuldades com mais facilidade e agem com mais naturalidade.

Ao interagir com seu filho especial, os pais não devem focalizar as dificuldades ou impossibilidades, mas sim as possibilidades.

As pequenas coisas da rotina diária mostram-se importantes estímulos para o desenvolvimento da criança. Conversar com o bebê, dar-lhe atenção, tocá-lo e acariciá-lo. Dar-lhe um colinho, falar dele com naturalidade, dançar com ele, sentir orgulho por ele ser seu filho…

Vesti-lo com roupas bonitas, fazer festa para comemorar o aniversário dele, reunir a família na mesma mesa para as refeições…

Com os terapeutas pode-se aprender as melhores formas de segurar um bebê, de manipulá-lo, alimentá-lo, para potencializar os efeitos das terapias. Tudo com carinho, de forma natural, sem neuroses.

Inclui-lo sempre, o máximo possível, na rotina da família de passeios, viagens, idas ao restaurante, etc. Os pais não devem se incomodar com os olhares alheios, que na maioria das vezes são apenas de curiosidade, mas geralmente traduzem também solidariedade. Mesmo nas poucas ocasiões em que os olhares ou atitudes de terceiros traduzirem preconceito ou crítica, a simples presença da família em local público com seu filho especial exerce um efeito pedagógico poderoso na transformação da sociedade preconceituosa e excludente.

A participação em associações que congregam famílias de crianças que tem o mesmo problema costuma ser de muita utilidade e deve ser estimulada pelos profissionais.

Não é demais repetir que atualmente, uma nova forma de relacionamento da sociedade com as pessoas que tem deficiências está ganhando força. É a Inclusão, uma verdadeira revolução pacífica que transforma o deficiente em cidadão. A partir dela, cabe à sociedade abrir espaços, criar alternativas para que qualquer pessoa, com qualquer deficiência, possa conviver com os demais, nos mesmos locais e atividades das pessoas de sua idade, respeitada em suas limitações.

A Organização das Nações Unidas – ONU – editou uma resolução com normas técnicas sobre Inclusão, versando sobre diversas áreas, como saúde educação, lazer, etc. E estabeleceu o prazo de que até o ano 2.010 em todo o mundo esteja totalmente implantada a Sociedade Inclusiva.

Lembro que Editora WVA possui uma excelente coleção de livros sobre Inclusão, disponível para todos, pais e profissionais que se interessem por este atualíssimo e importante tema.

Quais as expectativas que os pais podem ter sobre o desenvolvimento de seu filho especial? Quais serão os limites desta criança?

Ninguém sabe de antemão!

Os profissionais, de modo geral, são mais presos a dogmas e se permitem menos ousadias.

Mas aos pais é permitido sonhar. Não com curas impossíveis ou milagrosas, mas pelo menos com os pequenos milagres do cotidiano. Aqueles aos quais as vezes alguns profissionais não dão tanto valor, mas que para os pais representam enormes vitórias.

Um sorriso, um carinho, uma palavra, um gesto, vindo daquela criança das quais as vezes nada se esperava, para quem nada se prognosticava, traz ao coração dos pais um sentimento único de amor e realização, desconhecido para quem não viveu situação semelhante.

É claro que os profissionais sensíveis também vão partilhar da alegria e emoção destas vitórias.

Quando os pais partem com seu filho especial para esta viagem pela vida, ninguém sabe sequer se o avião vai mesmo voar ou que altitude e distância ele pode alcançar. Nem tampouco se conhecem as paisagens e as emoções que eles vão experimentar. Tudo vai depender, antes de mais nada, deles mesmos.

Ruy do Amaral Pupo Filho
Pediatra, Sanitarista e Escritor

 
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